Descrição |
A Várzea é um bairro localizado na zona urbana da cidade de Recife, na várzea do rio Capibaribe, o que dá origem ao nome do bairro. Sua raiz histórica se dá na ocupação e colonização do território brasileiro desde o século XVI, por ser uma região propícia para o cultivo da cana de açúcar e para a instalação dos engenhos, que posteriormente, no século XVIII e XIX, foram substituídos pelas usinas.
Um lugar repleto de histórias e memórias que desde a colonização é habitado por uma diversidade de povos e culturas que foram se estabelecendo na região ao longo do tempo. Este contexto histórico cultural permite compreender a origem do território da Várzea. As informações coletadas a respeito da história do bairro e a pesquisa de campo realizada possibilitaram perceber a imbricada teia de relações que vem se estabelecendo entre as pessoas e o lugar ao longo do tempo, construindo uma intrínseca relação entre história, memória, educação e cultura. Diante disso, a tessitura de relações na constituição deste território e as diversas formas de organizações de luta e resistência evidenciaram um território profícuo e de fundamental importância para esta pesquisa no sentido de dar oportunidade para que a Universidade (UFPE) possa compreender seu entorno a luz de novos olhares e perspectivas.
Sendo assim, a escolha da Escola de Arte João Pernambuco e do movimento Salve o Casarão da Várzea neste território, nos permite analisar e compreender as relações entre os sujeitos e as formas de organização coletiva, suas lutas e resistências, por meio do tempo presente, sem perder as referências dos movimentos e ações de educação e cultura que atuaram no passado, que contribuíram e inspiraram para as atividades desenvolvidas a partir da imbricada relação entre educação e cultura.
Assim foram definidos os seguintes princípios norteadores da pesquisa de campo: histórias das pessoas/lugares - objetos, caixinhas de memórias, documentos e fotos; enraizamento - pertencimento individual/coletivo, construção de relações e vínculos; mobilização - ações, produções, movimentos e práticas artísticas e culturais – empoderamento; germinações - cultivo - trocas de experiências; e cultos e crenças.
A partir deste mapa temático do trabalho de campo da pesquisa também foram identificados pessoas importantes a serem entrevistadas a partir das relações já estabelecidas do Neafi com articuladores, educadores e artistas como o Índio Batera e Karla Fornari, que residem na Várzea, e Lula Eurico, morador do Arruado.
A pesquisa de campo se iniciou em março/abril de 2017 com a articulação do Índio Batera com alguns moradores do bairro da Várzea, que tinham atuações, ao longo as sua trajetória de vida, na área de cultura e educação, entre eles: Professora Carmen, Professora Antonieta, D. Carminha, Moisés, Priscila e outros sujeitos que foram surgindo a partir desses contatos. Também foram realizadas visitas a Escola João Pernambuco que permitiu compreender sua origem e criação, como também seu processo de institucionalização enquanto Escola de Arte e as questões relacionadas ao currículo, metodologia e processo pedagógico a partir das entrevistas com o diretor, a coordenadora pedagógica e os estudantes.
Assim foi se construindo uma teia de relações a partir das entrevistas com os sujeitos, como também a partir das vivências e observações participantes realizadas no bairro durante o Festival de Inverno da Várzea (FIV - ano VIII) e a festa colaborativa realizada no Casarão Magitot, promovida pelo movimento Salve o Casarão da Várzea, em agosto e setembro de 2017. Dessas observações participantes, chegamos ao Tank, João Ricardo, Professor Pernã, Professor Betão, Carol e Vanessa, que muito contribuíram para a pesquisa de campo, nos trazendo elementos importantes sobre as atividades e coletivos do passado e presente da Várzea, fornecendo pistas e elementos para compreender a complexidade de relações e movimentos culturais estabelecidos no bairro ao longo do tempo.
As entrevistas narrativas realizadas permitiram interceptar as histórias individuais em suas teias de relações coletivas, a partir da convivência dos sujeitos no cotidiano, onde as manifestações culturais, por meio das artes em suas diferentes linguagens e formas de organização, confluíram para a promoção do encontro entre as pessoas e, ainda, possibilitaram a aproximação das mesmas entorno dos seus pontos de convergência. Como, por exemplo, as pessoas atuantes do maracatu, da capoeira, do grupo de coco, do hip hop, do esporte, que se uniram para a luta e criação de uma escola de arte, que na década de 1990 se tornou a Escola de Arte João Pernambuco e, mais recentemente, as pessoas dos diversos coletivos que vem se reunindo entorno do movimento Salve o Casarão da Várzea, no intuito de torná-lo um mercado público cultural.
A análise das entrevistas e observações em consonância com as pesquisas bibliográficas realizadas em textos, livros, revistas e vídeos no youtube possibilitaram perceber características muito peculiares de como de dão as relações entre os sujeitos partir da convivência comunitária, como também a formação dos grupos e coletivos de atividades culturais, que se reúnem para a realização de eventos que já fazem parte do calendário anual do bairro, como o FIV, que já está na sua oitava edição.
Uma característica marcante que expressa um diferencial no território da Várzea é o sentimento de pertencimento e identidade dos sujeitos em relação a este bairro/território, que faz com que as pessoas se mobilizem para a criação e manutenção destes grupos culturais ao longo do tempo, permitindo assim que a convivência em grupo no aprendizado e/ou exercício de determinada atividade (maracatu, capoeira, coco, hip hop e etc) esteja além da relação de ensino aprendizagem entorno da linguagem artística e/ou manifestação cultural, provocando um sentimento de identidade cultural enquanto moradores do bairro da várzea, conectados do local ao nacional. Ou seja, percebe-se uma intersecção da cultura e educação a partir do fazer e viver as manifestações culturais conectados a cultura local, estadual, brasileira.
A produção textual desse relatório da pesquisa de campo está em curso, o que nos permite aprofundar as análises de cada um dos espaços e movimentos escolhidos (Escola de Arte João Pernambuco e Movimento Salve o Casarão da Várzea) no sentido de analisar as experiências a luz das categorias de análises elencadas no texto teórico metodológico apresentado na oficina “Perspectivas teórico-metodológicas de análise de dados da pesquisa de campo”.
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